terça-feira, 27 de setembro de 2011

O QUE CABE NA DANÇA DO VENTRE?




É nato do homem uma tendencialidade a classificar coisas, nomear, fazer topologias em caixinhas e guardá-las lá. E diante dessa constatação fico imaginando o quanto temos “alargado” essa caixinha – dança do ventre – para caber tantas famílias de movimentos, estilos, padrões, modismos, escolas, nomes de professoras e bailarinas, que transitaram e transitam nessa prática “sem fronteiras”. 

ABRE JANELA:
Coloco “sem fronteiras” entre aspas, uma vez que a ausência de fronteira que me refiro é a geográfica. Afinal a dança do ventre faz parte do mundo globalizado. Dança-se no Japão, no Egito, na Bahia e em São Paulo... Assim como em tantos outros lugares. Talvez, o melhor fosse escrever – “fronteiras móveis”.

Contudo, me parece que existe outro tipo de demarcação, que é cada vez mais real e excludente do que nunca: as fronteiras mercadológicas, que territorializam a dança do ventre em nomenclaturas escolares e particulares.  Que me faz pensar, que estamos muitas vezes reduzindo a dança ao contexto “particular”, e o mais grave globalizando o particular, sem ao menos refletir sobre isso. Um exemplo é o número de práticas/danças achatadas em um nome – Técnica Maria... Técnica Joaninha... Técnica Luluzinha... Nomeações particulares, finalizadas com o seguinte enunciado: A Arte da Dança do Ventre. Quem nunca se deparou com: Fulaninha tal, a Arte da Dança do Ventre?!!!!  Como se a dança do ventre tivesse um nome ou um sobrenome. Ou como se essa técnica particularizada/nome fosse a “carteira de identidade” de quem deseja fazer dança do ventre. Você já pensou que seu nome na dança do ventre pode ter muitas Marias, Joaninhas, Luluzinhas e isso ser uma etiqueta mercadológica e não a livre escolha de se fazer Arte/Dança?

E daí advém à segunda “encrenca”... Como definir a dança do ventre?  Na minha caixinha tem tantos nomes. Que me pergunto: o que cabe nela? O quanto está alargada... È dança do ventre ou “danças do ventre”?

Vamos ao exercício...

Tente responder: O que é dança do ventre, afinal??????

Fico imaginado a natureza das respostas. DANÇA DO VENTRE É... Pode-se TENTAR responder a partir de uma escolha conceitual, de uma prática de atuação, da historiografia ou de uma simples descrição do vocabulário, apoiada nas famílias de movimentos. E mesmo, respondendo a partir de todas essas possibilidades, não esgotaremos a resposta nunca.

Fico pensando nesse desafio... E de como seria bem construtivo criar um corpo de argumentos capaz de dar conta dessa resposta e localizar o que há nessa caixinha, chamada dança do ventre. Afinal já passou a hora de construirmos respostas diante de tantos fazeres inapropriados.

Parto para o desafio. E não é que me pego comparando o que poderia “chamar de dança do ventre”????  Isto sim. isto não. Ou isso ou aquilo.  Vejo que colado com minha tendência classificatória – arrumar tudo dentro de um nome vem outra tendência: a de comparar diversas manifestações da dança do ventre. Parto para valoração de estilos, técnicas e bailarinas. Ahhh... tal técnica é a melhor, o estilo tal é o verdadeiro, etc. Um processo de escolhas guiado por uma eleição que hierarquiza A em função de B, como se isso resolvesse a responder o que cabe na dança do ventre.  Penso que muitas escolhas se tornam “senhas”, senhas que não abrem para reflexão e se quer para uma discussão sobre.  Engessa o nosso olhar e abre espaços para a estabilização de estilos.

Nossa tendencialidade comparativa é interessante enquanto exercício na elaboração de argumentos, porém incabível em juízos de eleição. Eleger é reduzir diálogos, outras percepções, é dar um foco particular a uma dança que tem como mapa fronteiras móveis. É particularizar o que é livre de combinações e possibilidades.

Desafios/encrencas postas... Se não bastasse responder o que é “dança do ventre?” Como nos colocamos diante do plural: “danças do ventre”? É mais confortável pensar assim? Ajuda a alargar mais a caixinha? E enquanto dançarina intérprete, como preparar meu corpo diante de tantos particulares? Qual a informação/dança a seguir/apropriar-me para estar no mercado? E se eu não grifar nenhuma em particular? – Meu corpo tem a escolha de rejeitar o recurso de sublinhar técnicas?  E daí, como meu corpinho fica? Pertenço ao mercado ou não? Qual será o meu passaporte? Um passaporte com fronteiras móveis ou particulares? E além do nome (técnica de fulaninha tal), o que deveria destacar? Qual a intensidade/grifo que devo dar a essa técnica no meu corpo? Um pouco mais da técnica X, uma pitada da técnica da fulaninha tal...

Não pretendo aqui responder minhas inquietações, apenas colocá-las na mesa. Acho que de partida, já é um bom exercício. Ou quem sabe uma provocação para ajudar a pensar no quanto caímos na cilada de reduzir a dança a territórios particulares. Delimitar fronteiras, que de algum modo se tornaram móveis?

Gostaria de ir na contramão das tendências de padronização da dança em fazeres particulares. Uma voz que ajude a propagar que a dança enquanto expressão ARTÍSTICA, não se reduz a uma política mercadológica. E, se houver ainda diversidade para o exercício de escolha – porque nem sempre quantidade significa pluralidade, se possa escolher ciente do para quê? Principalmente porque a inserção no mercado da dança do ventre e a empregabilidade estão diretamente proporcionais as escolhas feitas. Dança-se pelo que essa escolha representa - a filiação mercadológica. Este é o passaporte, a grife que você dança.

Neste cenário que às vezes parece incluir, mas que tende a exclusão, como prosseguir sem o desejo de etiquetar meu corpo, mas usar das diversos grifos particulares para a construção de uma dança co-autoral (sem autorias impostas)? Estar no palco – dançar sem  escolher a música da moda, a roupa do atelier da moda, ao grifo particular – etiqueta filiada, coleções de passos pré-determinados e muitas vezes já conhecidos pelo público, que também é uma réplica desse sistema?!!!! Enfim... Será que o que nos resta hoje, é embrulhar a caixinha da dança do ventre com papel etiquetado por alguma grife do mercado?

Mais do que esgotar respostas... Deixo esse texto como resposta a minha capacidade de indignar-me,  em específico com um sistema que denomina dança/arte um corpo etiquetado. 

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

ELISA E SEUS PENSAMENTOS CORPORIFICADOS...

Então... Desde que Lisoca começou a comer as papinhas, tenta de tudo para não comer o pratinho todo. Conversa com a boca cheia, aponta para os objetos mais óbvios que temos - sofá, porta-retrato, vassoura, balde, etc. Tudo para dispersar e assim conseguir colocar a mamãe, aqui, no bolso. Como estratégia de sobrevivência, criei um código de recompensa - ao final da saga - alimentar Maria Elisa, grito: "acabouuuuuu" e levanto os braços, seguido de um bater de palmas, como um parabéns. Não é que Lisoca aprendeu? Já na terceira garfada, ela mesma levanta os braços e bate as palminhas, como se falasse: "acabou mamãe". Juntas rimos... e ela continua levantando os bracinhos, na 4ª, 5ª garfada... Pensamentos corporificados de minha bebê.