sábado, 19 de junho de 2010

TCE SOBRE DANÇA TRIBAL: UMA PESQUISA QUE INAUGURA UM CAMPO DE ESTUDO EM SALVADOR


Na quinta passada, 17 de dezembro de 2010, fiz parte da banca examinadora do trabalho de conclusão de estágio da dançarina-pesquisadora Joline Andrade, orientanda da Profa. Virgínia Chaves, graduanda do Curso de Licenciatura em Dança da Univerrsidade Federal da Bahia. E gostaria de usar esse espaço para compartilhar com vocês essa experiência, afinal temos o dever de divulgar iniciativas comprometidas em tratar a dança como objeto de pesquisa, fora do senso comum.
Em primeiro lugar, devo parabenizar a Escola de Dança da UFBA, por estimular seus alunos pelo viés da pesquisa artística e acadêmica. Num fazer, onde prática e teoria andam imbricados. Sem dicotomias que colaboram para a hegemonia de entendimentos como o de quem faz dança, não precisa pensar, apenas sentir. Assim, o que deveria ser um TCE, no formato de um relatório de estágio supervisionado, apresentou-se como um estudo crítico reflexivo sobre uma prática. Com uma rica argumentação teórico-prática sobre a dança tribal fundamentada por uma filiação teórica, que não deixa nada a desejar aos esboços iniciais de uma pesquisa de pós-graduação. Tanto que, o estudo inicial feito por Joline, com alguns ajustes poderá se transformar facilmente num pré-projeto de seleção de mestrado.
Em segundo lugar, gostaria de parabenizar Joline pelas articulações teóricas apresentadas no texto. Que muito se devem ao seu percurso na Universidade, pois é perceptível o modo como o acesso (aproveitamento) ao conhecimento no ambiente da graduação, faz, SIM, toda a diferença. Pois, fui professora substituta dessa disciplina - PRÁTICA DO ENSINO DA DANÇA e, devo confessar que cada aluna (o) opta por diversos processos de reflexão. Alguns, constroem conexões muito iniciais, enquanto outros, conseguem dar saltos significativos. Sem que isso, seja uma avaliação hierárquica, entretanto, é preciso pontuar as diferenças.
Vamos ao TCE...
A começar pelo título:
DANÇA TRIBAL: PLURALIDADE ÉTNICA E FUSÃO CONTEMPORÂNEA
Achei muito interessante essa idéia trazida de imediato, ou seja, a dança tribal como uma configuração plural e em fusão. Que no decorrer do texto é explicado a partir dos rastros de algumas matrizes culturais que constituem a dança tribal, repropostas como identidades MIXADAS (muito bom essa definição) que se organizam em processos de fusão.
A arquitetura teórica:
A análise dos dados coletados durante o estágio e a construção do texto se deu a partir " das teorias do hibridismo e mestiçagem nos estudos de sociologia de Serge Gruzisnki e Peter Burke, na concepção de identidade cultural na pós-modernidade desenvolvida por Stuart Hall, no entendimento da Complexidade através do sociólogo/antropólogo/historiador Edgar Morin, nos estudos da sociedade de consumo de Jean Baudrillard e finalmente em autoras que organizam estas e outras informações no pensamento sobre a dança como Helena Katz, Christine Greiner e Laurence Louppe". (trecho extraído do resumo)
Conexões apresentadas:
- O ENTENDIMENTO DA NOMECLATURA TRIBAL (a partir da idéia de tribos);
- A EVIDÊNCIA DA MESCLAGEM PRESENTE NA FORMAÇÃO DA DANÇA TRIBAL;
- HIPÓTESES PARA A PREDOMINÂNCIA DE ELEMENTOS DA DANÇA DO VENTRE (70%) NA ORGANIZAÇÃO DA DANÇA TRIBAL, A PARTIR DE FENÔMENOS DE ADAPTAÇÃO E APPROPRIAÇÃO EXPOSTOS POR PETER BURKE (LIVRO HIBRIDISMO CULTURAL, 2003);
- A CONSTITUIÇÃO DA DANÇA A PARTIR DE IDENTIDADES (MÓVEIS E EM RELAÇÃO), NOMEADAS COMO IDENTIDADES EM FRACTAIS;
- UM ESBOÇO DE DISCUSSÃO SOBRE O CORPO FEMININO, CORPO ERÓTICO E CORPO DE CONSUMO NA DANÇA TRIBAL E NA DANÇA DO VENTRE (constitutiva da dança tribal) PELO FILTRO DE BAUDRILLARD (1991);
- UMA ARTICULAÇÃO CONCEITUAL E ESTÉTICA ENTRE A PERFORMANCE UTILIZADA POR NEY MATOGROSSO (durante a sua atuação no grupo Secos & Molhados, 1973-1974) E AS PERFORMANCES DE DANÇA TRIBAL REALIZADAS NOS ÚLTIMOS ANOS. PELA ÓTICA DO HIBRIDISMO, PERFORMANCE E MOVIMENTOS DE CONTRA-CULTURA.
Conexões e reproposições que me fizeram pensar e propor para Joline alguns desdobramentos para pesquisas futuras. Pois, acredito que um bom trabalho tem essa função, inicialmente ensinar o outro, já que é uma produção de conhecimento e não apenas uma informação a ser acessada, como também servir como ignição para outras trilhas. É por isso que a noção de autoria é reproposta hoje, como co-autoria, uma vez que quando a informação caí no mundo, ela caminha com pernas próprias e instiga o outro a produzir/propor juntamente com o autor inicial. E assim, segue minhas proposições...
- Pensar sobre mecanismos para potencializar a tendência de mesclagem da dança tribal como um andítodo para padtonizações. Pois, AINDA que, hoje se tenha uma diversidade estilisca muito grande, como a exemplo das fusões californianas: o jazz fusion, gothic tribal fusion, vintage bellydance, balkan fusion, afro-bellydance fusion, entre outras, percebe-se um movimento de padronização das coreografias como produtos de mercado. O que de alguma forma implicaria numa produção em massa, principalmente pela mídia, gerando estabilidade aos processos de replicação e a depender, uma "perda" das mesclas COMO transformações contínuas.
- Refletir sobre a armadilha criada em torno da exotização da dança tribal. Pois, se por um lado a dança tribal coneguiu romper com as estratégias de erotização feitas com a dança do ventre, hoje torna-se refém de ser etiquetada como um produto exótico. Uma tendência mercadológica de sublinhar o exótico (assim como foi feito com as culturas distintas do colonizador, basta lembrar do que foi feito com os nossos índios), reforçando uma leitura reduzida de um fenômeno. Ou seja, achata-se a complexidade da dança e sublinha o exótico que o outro lê. E muitas das bailarinas, talvez, têm seguido essa tendência. Muito observado na forma como valoriza o apresentar-se na dança, o figurino e a maquiagem, sem dar a mesma "atenção" aos processos investigativos do corpo. A questão aqui posta é a redução da complexidade da dança e a produção em massa de uma dança caricatural. Enfim, muitas vezes uma dança que atende a consumo mercadológico e não ao entendimento de produção artística. Como ESCAPAR dessa armadilha?
- A idéia de performance contida na dança tribal. Algo a ser explorado, principalmente a partir dessa articulação com o "performer" Ney Matogrosso. Seria o sentido performativo uma estratégia de sobrevivência da dança tribal?
Enfim, essas são as minhas inquietações.
Espero que Joline possa difundir sua pesquisa e contribuir para ampliação do entendimento sobre a dança tribal. A chamada no blog é apenas um passo inicial. Recomendo para quem se interessar, tentar entrar em contato com essa pesquisadora, que corajosamente inaugura um campo de pesquisa.

5 comentários:

  1. bravissimo!! uma discussao academica é necessaria para detectar essa tendencia de hibridismo, rotulos e claro o olhar colonialista, embora essa dança descontextualize os movimentos de seu contexto original. imagino uma boa saida para a dança tribal como fusao e pesquisa de movimentos e narrativas de forma experimental.irei pesquisar mais sobre alguns desses autores e gostaria de ler a pesquisa na integra.
    olivia-pontes@hotmail.com

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  2. Oi Olívia,

    Vou pedir a Joline para entrar em contato com você, para que ela lhe envie a monografia. Beijinhos

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  3. achei interessantissimo e mt me alegra ler uma opniao tao esclarecida e correta acerca desse tipo de danca, adooooroooo ler! que venham mais estudos, mais analises criticas, que possam construir ou ainda reconstruir a bailarina e sua definicao do que e dancar!parabens!!

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  4. Muito bem , estou feliz com estes resultados apresentados aqui.
    Parabéns a Joline pela pesquisa!
    É maravilhoso adquirir novos conhecimentos e entender a dança que realizamos por outros viés, criando novas possibilidades criativas através da pesquisa.
    Sucessoooooo Joline e Marcia...

    Italo ZAzu.

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  5. Olá queridos(as)!

    Já está disponível a minha monografia apresentada como trabalho de conclusão do curso de licenciatura em dança pela Universade Federal da Bahia. Aos que se sentirem interessados para esta leitura entrem em contato pois encaminharei o link para download.

    joline_teixeira@hotmail.com

    Att,
    Joline Andrade

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